segunda-feira, 20 de junho de 2011

SERMÃO DO CULTO MATUTINO - Misericórdia quero, e não sacrifícios...

Misericórdia quero não sacrifícios

“Misericórdia quero, e não sacrifício, e o conhecimento de Deus, mais do que holocaustos”

Introdução:
Queridos irmãos e irmãs...
Segundo o Calendário Litúrgico estamos na segunda parte do Tempo Comum, no 1º Domingo após o Pentecostes. O fato de haver no Calendário Litúrgico o Tempo Comum, ressalta o significado de que Deus não é SENHOR somente das coisas extraordinárias, mas o é também do cotidiano, do dia a dia.
O Lecionário Comum nos propõe as seguintes leituras bíblicas para hoje: 1ª Leitura: Gênesis 1.1-4; 2ª Leitura: 2 Coríntios 13.11-13; Evangelho: Mateus 28.16-20; e o Salmo: 8.
Sou um pregador que procura valorizar as indicações bíblicas feitas pelo Lecionário, mas hoje gostaria de interromper esta dinâmica e convidá-los a refletir sobre outro texto que está em meu coração. Trata-se de Oséias 5.15 – 6.6.
O texto nos alerta para o fato de que Deus prefere a misericórdia ao invés do sacrifício. Ele questiona a religiosidade superficial, as atitudes externas (liturgias e ritos) que não representam o verdadeiro sentimento do coração.
PORTANTO, convido-os a refletir sobre o discurso e a prática. Como cristãos, nossa prática deve ser condizente ao nosso discurso. De nada adianta elaborarmos discursos e liturgias sobre os preceitos divinos, muito bem elaborados teologicamente, se não vivermos de forma condizentes a eles. Serão meras palavras.
O texto de Oséias 6,3-6 é de grande valia para a nossa reflexão. Pois como metodistas, um dos pontos de nossa teologia é o equilíbrio entre os Atos de Piedade (relação vertical – nós e Deus) e as Obras de Misericórdia (relação horizontal – nós e o próximo).
Portanto, convido-os neste instante a refletirmos sobre este texto bíblico.
Ouçamos a leitura do texto sagrado.

Clique abaixo e confira o restante do sermão


Texto: Oséias 5,15-6,6
15  Irei e voltarei para o meu lugar, até que se reconheçam culpados e busquem a minha face; estando eles angustiados, cedo me buscarão, dizendo:
1  Vinde, e tornemos para o SENHOR, porque ele nos despedaçou e nos sarará; fez a ferida e a ligará.
2  Depois de dois dias, nos revigorará; ao terceiro dia, nos levantará, e viveremos diante dele.
3  Conheçamos e prossigamos em conhecer ao SENHOR; como a alva, a sua vinda é certa; e ele descerá sobre nós como a chuva, como chuva serôdia que rega a terra.
4  Que te farei, ó Efraim? Que te farei, ó Judá? Porque o vosso amor é como a nuvem da manhã e como o orvalho da madrugada, que cedo passa.
5  Por isso, os abati por meio dos profetas; pela palavra da minha boca, os matei; e os meus juízos sairão como a luz.
6  Pois misericórdia quero, e não sacrifício, e o conhecimento de Deus, mais do que holocaustos.

Contexto
Oseias exerceu o seu ministério profético no reino do Norte (Israel), a partir de 750 a.C., numa época de grande conturbação.
Em termos políticos, foi uma fase marcada pela violência, insegurança e derramamento de muito sangue.
Os reinados eram muito curtos e terminavam sempre em revoluções, assassinatos e massacres.
Na tentativa de se manter no poder, alguns dirigentes assumiam alianças políticas com as potências da época. Isto causava uma grande instabilidade no Reino.
Em 721 a.C. Israel vai ser invadida  por Salamanasar V, da Assíria, perdendo assim a sua soberania nacional.
Em termos religiosos, é uma época de grande confusão… Exposto à influência cultural e religiosa dos povos circunvizinhos, Israel acolhe diversos deuses estrangeiros.
 Misturam-se elementos do Culto ao SENHOR, com elemento do culto a Baal.
Oséias sente profundamente o drama do sincretismo religioso que está pondo em perigo a fé do seu Povo.
A sua mensagem é um apelo para  que Israel não se deixe dominar pela idolatria (a que Oséias chama “prostituição”: o Povo é como uma “esposa” que abandonou o “marido” para correr atrás dos “amantes”).
O profeta convoca o seu Povo a redescobrir o amor de Deus – sempre presente na história de Israel – e a responder-Lhe com uma vontade sincera de viver em comunhão com Ele.

MENSAGEM
Vejamos a mensagem do texto:
No versículo 15, vemos uma expressão de Deus: “Irei e voltarei para o meu lugar, até que se reconheçam culpados e busquem a minha face; estando eles angustiados, cedo me buscarão”.
No início do capítulo 6, o profeta coloca na boca do Povo uma fórmula de arrependimento ou de penitência, provavelmente tomada da tradição cultual: “vinde, voltemos para o Senhor: Ele nos despedaçou, Ele nos curará; Ele fez a ferida, Ele nos porá o penso que cura”.
Contudo, o profeta olha para esta expressão com um olhar irónico…
Porquê a conversão do Povo não é sincera. Haverá, por parte do Povo, um desejo real de voltar para Deus e de deixar definitivamente a idolatria?
É a esta questão que Oséias levanta através deste texto. Ele parece ter dúvidas da sinceridade da “conversão” do Povo.
O que Israel diz é: “o Senhor é como a aurora, pontual e inevitável, como a chuva que empapa a terra”.
Já sabemos como é que Ele funciona, pois Ele é perfeitamente previsível; se soubermos fazer bem as coisas, podemos controlá-l’O, pô-l’O do nosso lado e recuperar a vida que perdemos (vers. 3).
Isto parece mais o resultado de uma atitude calculista de quem está convencido de que conhece Deus perfeitamente e é capaz de manejá-l’O e de manipulá-l’O, do que o resultado de uma atitude coerente e sincera, de um desejo verdadeiro de “conversão”.
A isto, como é que Deus reage?
O profeta descreve como que uma luta interior de Deus… “Que farei?” – pergunta Deus…
Mas logo vem a resposta: repetindo as imagens usadas pelo Povo, Deus assume que não vai ceder, pois essa “conversão” de Israel é totalmente superficial e, portanto, não passa de “conversa fiada” (“o vosso amor é como o nevoeiro da manhã, como o orvalho da madrugada que logo se evapora” – vers. 4).
Israel não está disposto a mudar o coração; só está disposto a “controlar” Deus para readquirir a vida… Ora, se não houver uma verdadeira transformação do coração, o amor do Povo por Deus não passa de uma piedosa declaração de boas intenções.
Como é que Israel manifesta no dia a dia a Deus essa sua vontade de “voltar para o Senhor”? É através de uma vida coerente com os mandamentos? É através de um amor que lhes sai do fundo do coração e que se expressa em gestos concretos de bondade, de justiça, de misericórdia?
Não. O “amor” de Israel ao SENHOR expressa-se através de ritos externos, de atos de culto… No entanto, os atos rituais (os “sacrifícios”) não significam nada por si próprios; são apenas atos exteriores ao homem… Não valerá de nada um culto – ainda que belo – que não resulte de uma atitude interior de amor e de vontade de comunhão com Deus (“conhecimento de Deus”).
O culto não pode ser um conjunto de ritos desligados da vida, destinados a aplacar Deus ou a comprar as suas bênçãos; mas tem de ser expressão de uma vida voltada para Ele, vivida ao ritmo da aliança, no respeito por Deus e pelas suas propostas.
Dizer que Deus quer “a misericórdia (“hesed”) e não os sacrifícios, o conhecimento de Deus (“daat Elohim”), mais que os holocaustos” (vers. 6), insere-se nesta lógica…
Significa que Deus não está interessado em rituais externos – mesmo que muito bem elaborados – que não sejam expressão dos sentimentos que vão no coração; o que interessa a Deus é um coração que aceita verdadeiramente viver em comunhão com Ele (“conhecimento de Deus”) e que é capaz de gestos concretos de amor, de ternura, de bondade, de misericórdia (“hesed”) em favor dos irmãos.

Conclusão
Vejamos algumas lições que podemos retirar deste texto:
O problema principal que aqui nos é posto é o da nossa relação com Deus. Deus nos chama para viver em aliança com Ele… Como é que nós respondemos ao Seu chamado? Com uma adesão verdadeira e sincera, que implica a totalidade da nossa vida, ou com um falso compromisso, sem exigência nem radicalidade?
Como numa relação humana, também na nossa relação com Deus a rotina, a monotonia, o cansaço, podem descolorir o amor. Entramos então num esquema religioso de resposta a Deus, que se baseia em gestos rituais, talvez corretos do ponto de vista litúrgico, mas que não são a expressão dos sentimentos do nosso coração.
João Wesley publicou vários de seus sermões. Seu objetivo era que os pregadores metodistas aprendessem através de seus textos e pregassem o Evangelho. Enquanto preparava este sermão, me veio à mente um dos sermões de Wesley. É o de número 17 que ele intitulou de “A circuncisão do Coração”. Ele vai afirmar que de nada adianta cumprir os ritos da lei (circuncisão), se o coração não estiver sendo fiel no ato (circuncisão do coração).
Podemos nos perguntar: Quando participamos do culto expressamos algumas palavras porque são impostas pela liturgia, ou é a expressão verdadeira de nosso louvor ao SENHOR?
A nossa oração é um momento de repetir palavras “sagradas”, ou um momento íntimo de encontro com o Senhor e de resposta ao seu amor?
Somos chamados a viver de acordo com os preceitos do SENHOR. De nada adianta um culto que não represente a vida, o nosso dia a dia.
O que vemos através deste texto é que Deus é misericordioso, e se desejamos viver conforme sua vontade devemos exercer a misericórdia.
Não basta apenas discursarmos sobre ela, somos chamados a vivê-la. Nossa prática e nosso discurso devem estar em coerência.
Portanto, se servimos a um Deus misericordioso, devemos ser misericordiosos.
Que o povo metodista da Catedral seja um povo solidário.
Que Deus nos abençoe!

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...
Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...