segunda-feira, 31 de outubro de 2016

RUMO AOS 500 ANOS - Reforma Protestante

Povo sem tradição morre a cada geração

Hoje, 31 de outubro, completa 499 anos que Martinho Lutero pregou as suas, hoje famosas, 95 Teses na porta da Catedral de Wittenberg. 

Sou pastor metodista, formado em Teologia e tive a oportunidade de também cursar a faculdade de História (licenciatura). Gosto muito de valorizar datas e eventos históricos através de reflexões pastorais, sermões e celebração cúlticas. Apesar da Igreja Metodista não ter participado deste movimento (séc. XVI), ela assumiu sua teologia desde o princípio (séc. XVIII).

Aproveitando o ensejo, apresento um brevíssimo histórico do Protestantismo, da origem à sua inclusão no território brasileiro. Este não é um texto acadêmico, mas uma partilha com os interessados em conhecer um pouco mais da história da Reforma Protestante e do Protestantismo Brasileiro.

Caminhamos rumo aos 500 anos deste movimento que em seus avanços e retrocessos gerou muitos frutos. 


Um pouco de história
Reforma Religiosa do século XVI

No século XVI era comum afixarem-se opiniões para debate em locais públicos para que os interessados tomassem conhecimento do assunto. Quando Lutero apresentou suas teses contra as indulgências ele estava agindo dentro da normalidade de seu tempo. Foi graças à invenção de Gutenberg - prensa com tipos móveis – que estas teses, bem como as idéias de Lutero foram divulgadas com rapidez por toda a Alemanha, iniciando assim um movimento que marcaria para sempre a história da igreja cristã – REFORMA RELIGIOSA (Protestantismo).

Nas 95 Teses Lutero afirmava que as indulgências não tinham poder para perdoar pecados e livrar almas da condenação; contestava o poder da Igreja como mediadora entre os fiéis e Deus; e assegurava que todos que se arrependessem eram remidos de seus pecados pela fé em Cristo, através da graça.  Ele não imaginava que sua convocação para debater estas teses se tornaria um movimento tão grande que abalaria as estruturas da igreja oficial.

Antes de Lutero muitas outras pessoas e movimentos contestaram os rumos da igreja, porém o momento histórico não lhes permitiu implementar inovações. Pode-se destacar entre eles os PRÉ-REFORMADORES John Wycliff (1325-1384) e John Huss (1372-1415). Ambos foram condenados pela igreja oficial como hereges.

Depois de Lutero (Alemanha), surgiram outros movimentos religiosos com o mesmo intuito, reformar a igreja cristã. Calvino em Genebra e Ziínglio em Zurique (Tradição Reformada); Simons em Zurique (Movimento Anabatista – Reforma Redical); e Henrique VIII na Inglaterra (Anglicanismo). Numa pesquisa mais apurada pode-se encontrar mais movimentos, mas para a finalidade deste texto os mencionados já basta.

Verifica-se que diferentemente da tradição católica, que apesar de sua diversidade conseguiu manter certa unidade institucional, o protestantismo que surgiu da Reforma do século XVI gerou várias tradições e instituições. Portanto, o correto é falar-se “protestantismos”, e não “protestantismo”.

Protestantismo Brasileiro

Ao abordar o “protestantismo brasileiro”, nos deparamos com uma questão mais complexa ainda, pois se verifica a implantação de várias tradições e instituições, em momentos históricos diferentes.

Primeiramente pode-se destacar duas tentativas fracassadas de inserção do protestantismo no território brasileiro: os franceses (1555 a 1560) no Rio de Janeiro e os holandeses (1630 a 1654) no nordeste.

Somente no início do século XIX a tradição protestante inseriu-se de forma definitiva no Brasil. Segundo Mendonça, pode-se falar de protestantismo de imigração, protestantismo de missão e pentecostalismo/neopentecostalismo.

Protestantismo de Imigração: Em decorrência da abertura dos portos brasileiros aos países amigos de Portugal (1808) e do incentivo do governo à imigração européia, chegaram ao Brasil luteranos, anglicanos e episcopais. Com o tratado de comércio e navegação firmado entre Portugal e Inglaterra (1810) concedeu-se aos ingleses a liberdade de culto e tolerância religiosa a outros grupos não-católicos residentes no Brasil. Este é o início do culto protestante no Brasil. Estas tradições protestantes não influenciaram e nem promoveram impactos na sociedade brasileira, pois seu objetivo era unicamente dar continuidade à tradição denominacional, sem fins missionários.

Protestantismo de Missão: Somente após 1850, com a chegada de missionários protestantes advindos da América do Norte com o objetivo de implantar suas missões, que o protestantismo causou um certo impacto na sociedade brasileira. É neste momento que instalam-se no Brasil as igrejas: Congregacional, Presbiteriana, Metodista, Batista e Episcopal. Segundo Mendonça este movimento deve ser chamado de Protestantismo de Missão. Não reconhecendo o trabalho missionário promovido pelo catolicismo, estas denominações chegaram ao Brasil com um objetivo claro de pregar a fé protestante/evangélica.

Pentecostalismo e Neopentecostalismo: É possível dividir o movimento pentecostal e neopentecostal brasileiro em pelo menos três grupos diferentes: (a) Décadas 1910-1940: chegada simultânea da Congregação Cristã no Brasil e da Assembléia de Deus, que dominam o campo por 40 anos; (b) Décadas 1950-1960: campo pentecostal se fragmenta, surgem novos grupos – Evangelho Quadrangular, Brasil Para Cristo e Deus é Amor; (c) Anos 70 até os dias atuais: neopentecostalismo – Igreja Universal do Reino de Deus, Igreja Internacional da Graça de Deus e muitos outros movimentos.

Assim como vimos que foram vários os movimentos de reforma da igreja que foram incluídos na chamada Reforma Protestante, vemos também que é impossível falar-se de Protestantismo Brasileiro. O correto é afirmar que existem varias tradições protestantes no Brasil. Portanto, “Protestantismos” brasileiro.

Outro ponto curioso com respeito ao movimento protestante no Brasil está ligado ao campo da conceituação de alguns termos. Há questões de ordem semântica, bem como de fundo histórico que precisam ser compreendidas.

Ao perguntar a uma pessoa, seja ela cristã ou não, qual a diferença entre cristão, protestante, evangélico e crente, receberemos definições as mais variadas possíveis. Alguns enfatizarão algumas diferenças, outros dirão que trata-se da mesma coisa.

Apresento aqui alguns apontamentos, baseado no texto de Mendonça (MENDONÇA & VELASQUES, 1990, p. 13-16) que podem nos ajudar nesta compreensão.

Segundo o Prof. Mendonça, enquanto na Europa e nos Estados Unidos os cristãos não-católicos se auto-identificam como cristãos, sendo secundária a identificação pelo ramo a que pertencem, no Brasil, assim com o em toda a América Latina, a auto identificação protestante tem sido complicada. No Brasil, esta questão tem história.

Crente: Esta nomenclatura foi introduzida pelos missionários norte-americanos (protestantismo de missão) para identificar as pessoas que iam aderindo às suas denominações. O crente era aquele que, abandonando suas antigas crenças e práticas religiosas (catolicismo), “convertiam-se” verdadeiramente a Jesus Cristo. Olhando de dentro deste movimento, ser crente era uma honra e um privilégio, porém, olhando de fora este era um estigma.

Evangélico: Termo cunhado pelo movimento evangelical. Este movimento surgiu no início do século XIX na Europa e depois se expandiu para os Estados Unidos. Ele foi uma reação frente expansionismo ultramontanista católico. Diante dessa força católica os protestantes se uniram através de ligas e alianças no propósito de fortalecer alguns princípios doutrinários comuns que os ajudasse a combater esse movimento. Pode-se chamar de uma “frente unida” evangélica. A auto-identificação de “evangélico” era individual e significava o compromisso da pessoa com esse conjunto de princípios doutrinários. Antes do indivíduo pertencer a uma denominação, ele era “evangélico”.

Protestante: Termo utilizado para referir-se ao movimento da Reforma Religiosa ocorrido na Europa do século XVI.

Ainda que estes termos tenham seus significados específicos e um momento histórico definido, Mendonça apresenta a identificação atual dos cristãos não-católicos no Brasil da seguinte forma: O termo “crentes” identifica pentecostais e protestantes tradicionais em regiões rurais; a designação “evangélicos” auto-identifica protestantes tradicionais de regiões urbanas e é preferido pelos “historiadores” dessas denominações; o termo “protestantes”é utilizado por historiadores, teólogos e sociólogos não necessariamente ligados a esses grupos.

Espero ter colaborado um pouquinho com seu conhecimento sobre nossa tradição protestante.

Abraços, Rev. Paulo Dias Nogueira

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